A Atualidade do
Pensamento Gandhiano
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Problemas como: a) desenvolvimento e industrializa��o (conforme entendidos nos pa�ses
ricos); b) defesa; c) localiza��o de instala��es militares, usinas nucleares, dep�sitos de
armas, lixo t�xico; d) monop�lio do controle de recursos naturais e dep�sitos minerais
localizados em diversas �reas dentro do Estado (muitas vezes ignorando os direitos e
interesses dos habitantes locais); e outros semelhantes, j� levaram a muitas situa��es de
confronto e conflito.
Estas e outras exig�ncias de mudan�a radical no status quo produziram conflitos em muitas
regi�es do mundo. Alguns foram n�o-violentos. Contudo, quando aqueles que se empenham
em lutas recorrem a meios violentos ou � for�a das armas, acabam enfrentando o poder
armado do Estado. S�o ent�o obrigados a encarar a disparidade entre o poderio estatal e o
poder ao qual t�m acesso. Essa disparidade levou � ado��o de t�ticas que visam reduzi-la: o
terrorismo e as t�ticas de guerrilha s�o dois exemplos.
Gandhi era um grande inovador, que mostrou o poder da n�o-viol�ncia como meio de luta e
resist�ncia. Ser� que os movimentos populares do s�culo 21 se inspirar�o nos meios n�o-
violentos que ele empregava? Que modos continuar�o relevantes? Que formas novas podemos
vislumbrar? H� necessidade de treinar as pessoas e os l�deres desses movimentos no uso de
m�todos similares, a fim de atingir metas ou conseguir a concilia��o? Que meios poderemos
empregar para conscientizar as pessoas da necessidade de refrear o seu poder de fogo, e de
p�r em pr�tica seu �mpeto revolucion�rio em defesa de seus direitos, por meio de processos
n�o-violentos?
De todas as amea�as � sobreviv�ncia da humanidade, aos valores humanos e ao ambiente que
enfrentamos hoje, a viol�ncia � talvez a mais vis�vel, a mais espetacular e, no entanto, a mais
sutil e mais subrept�cia. Encontramos suas manifesta��es diretas ou indiretas em quase todos
os n�veis, em quase todas as esferas sociais e em todas as institui��es que governam a nossa
vida. Ela parece ter-se imiscu�do em nossas almas e em nosso inconsciente.
A guerra � a manifesta��o mais �bvia e gigantesca da viol�ncia. Todos os s�culos viram
guerras, e elas talvez tenham sido consideradas como o �ltimo recurso para dirimir conflitos
entre na��es.
Mas parece que a pr�pria natureza da guerra sofreu uma metamorfose. As guerras entre as
na��es se transformaram em conflitos totais, que envolvem popula��es inteiras. Embora se
costume fazer uma distin��o entre as guerras globais e as limitadas - considerando cen�rio,
t�ticas e dura��o das opera��es -, todas elas, hoje, t�m efeitos semelhantes.
Em primeiro lugar, a distin��o entre ex�rcitos combatentes e civis n�o-combatentes foi
suprimida. Todos s�o vulner�veis, e talvez de modo igual. Todos s�o alvos de um ou outro
objetivo da guerra - atrito, terror, aniquila��o, eros�o da moral ou a determina��o de resistir
ao que se considera uma injusti�a.
Pesquisas internacionais registram que mais de 250 guerras, de um tipo ou de outro, foram
travadas no s�culo 20. Houve 110 milh�es de mortes relacionadas a elas. A propor��o de civis
e crian�as que perderam a vida dessa maneira aumentou em 63% nos anos 60; subiu para
74% nos anos 80; e chegou a 90% na �ltima d�cada do s�culo. Esses conflitos deixaram mais
de 50 milh�es de pessoas na condi��o de refugiados.
Um relat�rio das Na��es Unidas diz que, na �ltima d�cada, 2 milh�es de crian�as foram
mortas, e mais 5 a 6 milh�es foram gravemente feridas ou mutiladas. Incont�veis crian�as
testemunharam carnificinas, estupros e saques, com todo o trauma e efeitos psicol�gicos
conseq�entes. Muitos milh�es ficaram �rf�os. O mesmo relat�rio mostra ainda que mais de
250.000 soldados-crian�as (abaixo de 15 anos) participam de confrontos armados em todo o
mundo. Outros relat�rios falam de centenas de milhares de crian�as abaixo dos 5 anos que
perderam suas vidas em guerras civis na �frica. Ainda outro relat�rio descreve os horrores
perpetrados contra as mulheres nas �reas conflagradas, e afirmam que elas talvez tenham tido
que suportar as piores afli��es dos conflitos deste s�culo.
A tecnologia tamb�m teve o seu papel, na transforma��o da natureza da guerra e na escalada
da destrui��o e da depreda��o. Florestas inteiras foram desfolhadas, para combater as t�ticas
de guerrilha e insurrei��es. Armas de destrui��o em massa foram inventadas e instaladas - o
que inclui artefatos nucleares, qu�micos e bacteriol�gicos. Elas foram inventadas e preparadas
para destruir sociedades, devastar de modo indiscriminado e generalizado tudo o que a
radioatividade ou os germes possam atingir. Bem sabemos que seu efeito n�o se limita � �rea-
alvo. Nem mesmo se restringem a uma gera��o. Podem causar a morte instant�nea mais cruel
e horripilante, e tamb�m deixar efeitos que afligir�o gera��es ainda n�o nascidas.
N�o � mais necess�rio descrever os efeitos das armas nucleares. J� foi demonstrado que a
radioatividade n�o respeita fronteiras. O mais chocante e espantoso, por�m, � o fato de que a
possibilidade real de extermina��o n�o convenceu os governos a renunciar a tais
armamentos, a parar com os testes, destruir os estoques e descartar o lixo at�mico sem
espalhar danos, mesmo �s �reas que n�o possuem programas nucleares. J� se provou, sem
sombra de d�vida, que o mundo n�o poder� sobreviver se persistir a pol�tica armamentista
nuclear.
Ao mesmo tempo em que as armas de destrui��o em massa foram aperfei�oadas, foram
criadas outras, capazes de atingir alvos focais - arrasar resid�ncias de indiv�duos ou chefes de
Estado -, e alguns centros de poder decidem se t�m o direito de liquidar governantes
inconvenientes, mesmo quando estes s�o apoiados pelos povos que representam.
As enormes disparidades no poder de fogo dispon�vel - de um lado, para os Estados, e de
outro para grupos militantes que servem a objetivos ideol�gicos, �tnicos, religiosos ou outros
interesses -, resultaram no fato de que esses grupos recorrem ao terrorismo e � guerrilha.
Equa��es internacionais de interesse, o desejo de destruir centros de apoio, o desespero pela
incapacidade de adotar a guerra convencional apesar da vontade de
vingan�a e retalia��o, e muitos outros fatores, levaram � opera��o internacional de for�as
terroristas ou ao terrorismo transnacional, como � �s vezes descrito.
Isso representa um m�todo de agress�o transnacional, que busca os benef�cios da imunidade
pela dist�ncia, por outros fatores geogr�ficos, ou ainda pela resist�ncia do inimigo em
aumentar o conflito. Quaisquer que sejam as raz�es para o terrorismo em um determinado
Estado, ou al�m de suas fronteiras, seu prop�sito � criar o terror nas mentes de todos,
incluindo as massas. E o m�todo empregado para conseguir o reinado do terror � a destrui��o
seletiva - e indiscriminada - de vidas e propriedades.
As conex�es internacionais de grupos terroristas criaram uma real apreens�o quanto �
possibilidade das armas nucleares chegarem �s suas m�os. Os governos mostram-se muito
preocupados em formar uma opini�o p�blica internacional contra o terrorismo, e selar acordos
intergovernamentais para identificar, isolar e punir os chamados "Estados terroristas".
Devo agora mencionar os eventos traum�ticos de 11 de setembro de 2001 nos EUA, que
criaram ondas de impacto por todo o mundo e abriram os olhos de milh�es de pessoas para as
conseq��ncias terr�veis do terrorismo.
Naquele dia, quase que diante dos olhos at�nitos do mundo inteiro, milhares de vidas
inocentes foram extintas em um �timo. Estruturas poderosas e altaneiras foram reduzidas a
escombros, e milh�es de pessoas do mundo todo ficaram perplexas demais, at� mesmo para
entender as dimens�es da trag�dia e os desafios que ela trazia para o mundo.
O terrorismo n�o � algo novo. J� roubou muitas vidas inocentes, e causou imenso sofrimento a
muitas fam�lias em muitas partes do mundo. Levou � destrui��o de propriedades em grande
escala. Tem for�ado milh�es de pessoas a viver no medo e numa incerteza paralisadora. Seu
impacto sobre os inocentes foi indiscriminado. A maioria desses eventos aconteceu em
florestas ou cidades distantes do olhar do p�blico.
No dia 11 de setembro de 2001, por�m, o terrorismo desafiou o pr�prio cora��o do poder.
Afrontou a pot�ncia militar e econ�mica mais poderosa do mundo, e mostrou como poderosos
e inocentes eram do mesmo modo vulner�veis aos ataques. A m�dia tornou o cidad�o comum
consciente do que pode acontecer a qualquer um, a qualquer fam�lia ou na��o, a qualquer
momento.
Todos querem que essa amea�a cesse ou seja extinta; e todos concordam em que os
governos t�m a responsabilidade de defender seus cidad�os. Mas como eliminar o terrorismo?
A indigna��o que sentimos � leg�tima. No entanto, nesta hora de crise, o cidad�o precisa ser
tranq�ilizado de que as medidas que os governos tomar�o - e o sofrimento e os sacrif�cios
delas decorrentes - levar�o de fato � elimina��o do terror.
Ser� que o terrorismo pode ser eliminado por meio de ensaios sobre vingan�a e emula��o, e
pela melhoria dos instrumentos que os pr�prios terroristas empregam, massacrando inocentes
e transformando moradias em cemit�rios? Veremos o fim do terror eliminando os seus l�deres? �
poss�vel ser seletivo na abordagem do terrorismo, considerando-o admiss�vel quando est�o
envolvidos nossos interesses - e os de nossos atuais aliados -, e inadmiss�veis quando somos
o alvo? Ser� que a vingan�a e a retalia��o eliminar�o ou represar�o nosso sentimento de
injusti�a, eliminar�o as causas invocadas para justificar o terror? Teremos a responsabilidade
de examinar o que lhe d� origem? � poss�vel identificar as causas sem auto-exame e
introspec��o, sem olhar para dentro, a fim de verificar se alguma atitude ou a��o nossa
causou ou contribuiu para o senso de injusti�a, que hoje est� sendo explorado para justificar
tais m�todos desumanos de luta?
Estamos, portanto, diante de duas tarefas. Uma � detectar e eliminar o senso de injusti�a, e a
outra � perceber que, se entendemos que meios violentos s�o admiss�veis para obter justi�a
ou solucionar pend�ncias, estamos inclinados a seguir a l�gica da viol�ncia. E essa l�gica,
como dissemos antes, nos levar� � guerra e ao terrorismo, que ali�s se tornou uma modalidade
moderna de guerra.
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