O que � Ensinar? O que � um Professor?
[*]
Humberto Maturana
[*] Transcrito do trecho final da aula de encerramento de Humberto Maturana no curso de
Biologia Del Conocer, Facultad de Ciencias, Universidad de Chile, Santiago, em 27/07/90.
Gravado por Cristina Magro; transcrito por Nelson Vaz.


- Alguma outra pergunta?

- Sim, Professor. Que � um professor? Ou, quem � um professor?

- Humm (pausa)

(Risos)

(Escreve ao quadro negro:)

- Professor, Mestre. E, portanto, est� aqui: ensinar. Creio que aqui aparece este
conceito.
O que � ensinar? Eu lhes ensinei a Biologia do Conhecer? Sim, se algu�m abre a porta
desta sala... (desloca-se at� a porta, simula ouvir algu�m que bate � porta e, ent�o, se
desculpa, e diz a outro algu�m: ) ... "Nesta sala est� o Professor Humberto Maturana
ensinando Biologia do Conhecer" (desloca-se de volta:)
Eu lhes ensinei a Biologia do Conhecer? Em um sentido, com rela��o � responsabilidade
perante a Faculdade, eu lhes ensinei a Biologia do Conhecer.

(Risos)

- Mas o que fizemos n�s ao longo deste semestre?

- Desencadear mudan�as estruturais.

- Desencadear mudan�as estruturais, desencadear perturba��es. E como fizemos isso?

- Em coordena��es de coordena��es de a��es.

- Em coordena��es de coordena��es de a��es. Ou, seja: vivendo juntos. Claro, uma vez
por semana, viver juntos uma hora, uma hora e meia, duas horas, ou, alguns estudantes,
que permaneceram comigo mais horas... isso era viver juntos. Voc�s podem dizer: "Sim,
mas eu estava sentado escutando". Isso se estavam verdadeiramente escutando, como
espero.

(Risos)

- Estavam sendo tocados, alegrados, entristecidos, enraivecidos... Quer dizer, se
passaram todas as coisas do viver cotidiano. Mexeram com as id�ias, rejeitaram algumas.
Sa�ram daqui conversando isto e mais aquilo... "Estou fazendo um trabalho..." Estavam
imersos na pergunta: "Como prosseguir de acordo com o que lhes ia passando, vivendo
juntos, comigo, em um espa�o que se ia criando comigo."
Ent�o, qual foi a minha tarefa? Criar um espa�o de conviv�ncia. Isto � ensinar.
Bem, eu ensinei a voc�s. E voc�s, ensinaram a mim?

- Sim.

- Claro que sim! Ensinamo-nos mutuamente. "Ah, mas acontece que eu tinha a
responsabilidade do curso, e ia guiando o que acontecia". De certa forma, sim, de certa
forma, n�o. De certa forma, sim, porque h� certas coisas que eu entendo da
responsabilidade e do espa�o no qual me movo nesta conviv�ncia, e tinha uma certa
orienta��o, um fio condutor, um certo prop�sito. Mas voc�s, com suas perguntas, foram
empurrando esta coisa para l�, e para c�, e foram criando algo que foi se configurando
como nosso espa�o de conviv�ncia.

E o maravilhoso de tudo isso � que voc�s aceitaram que eu me aplicasse em criar um
espa�o de conviv�ncia com voc�s. Voc�s se d�o conta do significado disso? Foi
exatamente igual ao que ocorreu quando voc�s chegaram, como crian�as, ao jardim de
inf�ncia, e estavam tristes, emburrados, a Mam�e se foi, est�o chorando, "Ahhh, eu quero
minha m�e", e chega a professora, e oferece a m�o e voc�s a recusam, mas ela insiste, e,
ent�o, voc�s pegam sua m�o. E o que se passa quando a crian�a pega na m�o da
professora? Aceita um espa�o de conviv�ncia.

Com voc�s se passou a mesma coisa. Em algum momento, aceitaram minha m�o. E, no
momento em que aceitaram minha m�o, passamos a ser co-ensinantes. Passamos a
participar juntos neste espa�o de conviv�ncia. E nos transformamos, em congru�ncia...
De maneiras diferentes, porque, claro, temos vidas diferentes, temos diferentes espa�os
de perguntas, temos experi�ncias distintas. Mas nos transformamos juntos, e agora
podemos ter conversas que antes n�o pod�amos.
E quem � o professor? Algu�m que se aceita como guia na cria��o deste espa�o de
conviv�ncia. No momento em que eu digo a voc�s: "Perguntem", e aceito que voc�s me
guiem com suas perguntas, eu estou aceitando voc�s como professores, no sentido de
que voc�s me est�o mostrando espa�os de reflex�o onde eu devo ir.
Assim, o professor, ou professora, � uma pessoa que deseja esta responsabilidade de criar
um espa�o de conviv�ncia, este dom�nio de aceita��o rec�proca que se configura no
momento em que surge o professor em rela��o com seus alunos, e se produz uma
din�mica na qual v�o mudando juntos.
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