"Pot�ncias mundiais est�o por tr�s
de crises na �frica"

Para veterano mediador, tropas da ONU representam
interesses dos pa�ses ricos

Consultor noruegu�s Joan Galtung defende que Uni�o Africana seja fortalecida para
que suas tropas de paz atuem quando necess�rio

MARCELO NINIO
DA REDA��O
A solu��o mais sensata para os conflitos africanos � regional: fortalecer a Uni�o Africana e
dar condi��es para que suas tropas de paz possam interceder quando necess�rio. Al�m de
encorajar a solidariedade no continente, essa � uma forma de manter longe as tropas das
Na��es Unidas e da Otan, que defendem os interesses das grande pot�ncias, que est�o na
raiz das disputas africanas.
A opini�o � do noruegu�s Johan Galtung, veterano mediador e consultor da ONU que esteve
em S�o Paulo nesta semana para uma s�rie de semin�rios sobre a transforma��o de
conflitos por meios pac�ficos. Por tr�s das crises na Som�lia e no Sud�o est�o interesses
econ�micos das pot�ncias, diz Galtung, fundador do Instituto de Pesquisas da Paz de Oslo.
No Sud�o, h� uma disputa entre Estados Unidos e China pelos recursos naturais do pa�s,
principalmente o petr�leo, diz o mediador, o que faz do conflito �tnico-religioso em Darfur,
que j� deixou 400 mil mortos, apenas um pano de fundo.
"H� um jogo de interesses muito maior que est� sendo travado", diz Galtung, para quem os
EUA s� defendem o envio de tropas de paz ao Sud�o a fim de dominar o pa�s, assim como
fez no Iraque.
Quanto � Som�lia, que h� duas semanas caiu nas m�os de mil�cias isl�micas, o erro das
pot�ncias foi estimular a realiza��o de elei��es e a forma��o do governo no estilo
ocidental, sem considerar a estrutura pol�tica do pa�s, dominada por cl�s. "A Som�lia talvez
seja o �nico pa�s da �frica com um s� idioma e uma s� religi�o. A divis�o de poder n�o �
territorial, mas por parentesco. Isso n�o foi considerado e, com a entrada dos jihadistas, a
situa��o ficou bem mais perigosa", diz.
Criador da cadeira de estudos da paz em universidades, Galtung diz que quando come�ou a
ser mediador, h� 40 anos, nenhuma institui��o tratava formalmente do assunto. Hoje a paz
� disciplina em 500 universidades do mundo. Seu enfoque contrasta com aquele que �
tradicionalmente adotado no estudo de conflitos.
"O foco dos estudos estrat�gicos, que � outra forma de chamar os estudos da guerra, �
muito concreto: analisa-se a amea�a e como ela resulta em viol�ncia", explica. "Para n�s,
n�o h� lados bons ou maus nos conflitos, as rela��es � que s�o boas ou n�o e precisam
ser entendidas para avan�ar."
Outra diferen�a apontada por Galtung � que no estudo estrat�gico s� h� dois caminhos
para a resolu��o de conflitos: a dissuas�o e a destrui��o do inimigo. Na sua vis�o, a chave
da paz duradoura � encarar a solu��o das crises como um processo que nunca termina, em
vez de apenas exterminar a viol�ncia de forma imediatista. "A viol�ncia est� para o conflito
como a fuma�a est� para o fogo", diz Galtung. "Os jornais falam da fuma�a, n�o do fogo."
Galtung � extremamente cr�tico em rela��o � cobertura dos conflitos na imprensa, a qual
acusa de simplismo com uma ironia �cida. "Acho que grande parte dos correspondentes de
guerra foi rep�rter esportivo no come�o da carreira. Em sua vis�o o conflito � um jogo, com
dois jogadores, um perdedor e um vencedor. Acontece que o mundo � muito mais complexo
e nem sempre h� vencedores. Na Iugosl�via, havia 27 jogadores e o campo era totalmente
irregular", diz Galtung, usando na lapela um broche da rede de TV Al Jazira, do Qatar.
Entre os conflitos que ajudou a resolver est� a disputa territorial entre Equador e Peru, na
qual o estabelecimento de uma zona binacional terminou pacificamente o que era
considerado o �nico foco de tens�o geopol�tica da Am�rica do Sul. "Acho que uma das
coisas que facilitaram o meu trabalho foi que os Estados Unidos, por n�o terem interesse
econ�mico, n�o se envolveram", afirma.

Folha de S. Paulo, 18/06/2006
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